LUIZA - AUTORA: ANGÉLICA NOGUEIRA INSTAGRAM @angelicanogueirabhz
- Angélica Nogueira
- 22 de mai. de 2022
- 3 min de leitura

Luiza, tinha 30 anos, era alta, magra, cabelos castanhos curtos, e tinha um jeito peculiar de se vestir, gostava de usar vestidos com tons florais. Seu rosto era belo, sua postura transmitia sinceridade e seu jeito de olhar era o reflexo da sua essência. Às vezes, ela estava sorrindo, mas seus olhos entregavam sua tristeza, não havia como esconder. Tinha uma tatuagem no pulso em forma de duas esferas — um sol e uma lua.
Toda noite, Luiza ficava horas a contemplar a lua, sua estratégia para acalmar a alma. Ao acordar, costumava ficar na cama, mais um pouquinho, conversando com seus botões de rosa, refletindo sobre seus mundos e os elos doloridos que foram se formando ao longo dos últimos 5 anos, desde que se casara com João Felipe. Ficava algum tempo imersa em seus devaneios, em busca da entender a significância da vida.
Ao se levantar, passava pela sala, onde ele já estava. Fingia para si mesma, que poderia aguentar sua presença, por mais um tempo. Ainda não tivera a coragem de deixá-lo. Todo dia se passava no monótono ritual silencioso. A tortura causada pelo uso de sua máscara habitual, às vezes lhe impedia de respirar.
O barulho cortante de João Felipe passando as folhas do jornal, sentado em sua poltrona de couro quente e marrom, fumando o cachimbo, a fazia olhar de soslaio em sua direção, forçando um sorriso com os lábios tensos, de quem precisava parecer bem, para não sofrer com o desprezo e as palavras ásperas do marido.
Ela buscou toda a ajuda que podia. De início uma terapeuta. Poderia haver a chance de acontecer uma sinapse capaz de conectá-la a alguma corrente de energia, permitindo que uma luz se acendesse, no sentido de ter uma melhor compreensão do todo. Entendia que o drama e sofrimento, existem desde os primórdios da civilização humana. Ela poderia encontrar a saída para seu dilema.
Havia também, Tereza, aquela mulher de alma boa, que aparecia de vez em quando. Trazia flores do campo que coloriam seus olhos. Mergulhada em sua tristeza, sentia o toque das mãos abençoadas da amiga em seus cabelos — momentos em que tinha algum alento e o calor afetuoso percorria seu corpo, como uma cachoeira de águas quentes.
Na empresa onde trabalhava, Luiza tinha um amigo mais jovem, seu confidente. Ela, séria, casada e cansada da rotina. Ele, jovem e um vazio no coração. Se olharam e vislumbraram a salvação para amenizar a angústia. Todos os dias, trocavam suas canetas, junto com sorrisos, toques de mãos — só então, começavam as tarefas. Se reconheciam, sem suas máscaras habituais.
Desde que se casara, deixara de se pertence e sentia o peso das obrigações sociais. O encanto do amor desaparecera. João Felipe, demonstrava com frivolidade, que dava mais valor a seu carro do que a ela, que a princípio tanto o amara.
Com o passar do tempo, sua autoestima, autoconhecimento e autoconfiança foram tomando força, até perceber que havia chegado ao seu limite. Com o olhar rígido, maxilar tenso, respiração suspensa, dissera de súbito ao marido, encarando-o:
- João Felipe, preciso partir. Não, não aguento mais. Passei por um processo sofrido para chegar a esta decisão.
O ar abafado e obscuro. A casa na escuridão dos sentimentos que já não conseguiam esconder.
- Você já partiu Luiza. Não me amole. Vá, ficarei feliz em não te ver nunca mais. — Ele dissera, com a voz cortante e anasalada, que lhe causava calafrios.
Não houve mais conversa. Seu corpo todo tremia, seus olhos cheios de espanto, sobrancelhas arqueadas, transmitiam o nervosismo que dela se apossara, perante a atitude que não acreditava, seria capaz de tomar, e a resposta congelante do marido.
Assim, ela se foi como flor selvagem, emaranhada em lamentos, ouvindo as batidas do coração apaziguado, tinha um objetivo decidido, afastar-se dessa pessoa medíocre, incapaz de compartilhar afeto e que a tratava como objeto sexual.
Na luz de suas pálpebras — a lua e o mar — fontes de transformação, evolução, feminilidade. Dentro de si, crescia a certeza de que se sentiria energizada através das águas do oceano e do brilho do luar. Nas ondas que levam e lavam — a alma, o corpo, as dores e os amores.
Caminhou decidida até chegar lá — magnânimo mar. Deu um mergulho breve; sentiu a brisa leve e a coragem de soprar a todos os ventos, seus sentimentos.
Linhas curvas ondulavam entre suas pernas — instante desvairado. Vácuo quântico supremo, acumulara-se em seu alicerce enigmático. Remansada gritou: Ah! O mar!
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